Com o argumento da necessidade de aperfeiçoamento, o governo alterou completamente o Plano Plurianual (PPA) 2012-2015, que servirá de referência na elaboração dos orçamentos anuais dos próximos quatro anos. Mas, na visão de especialistas, as mudanças tornaram menos transparente essa ferramenta que tem o objetivo de planejar as ações do governo, o que dificultará o controle social sobre os gastos federais. Estudo elaborado pela Consultoria de Orçamento do Congresso aponta várias falhas no PPA, mostrando, por exemplo, que indicadores de desempenho em áreas estratégicas, como saúde e educação, sumiram do plano, o que na prática joga para debaixo do tapete o desempenho ruim de alguns programas do governo.
Na área da Educação, por exemplo, não será mais possível medir o índice de adequação da escolaridade na faixa entre 11 e 18 anos, simplesmente porque a partir de 2012 não haverá mais metas específicas anuais para este programa. O último indicador disponível mostra a distância entre os resultados obtidos e as metas. Em 2009, o índice estava em 4,10, bem longe da meta de 2011, de 5,40.
Outro exemplo de ação que não poderá mais ser avaliada é a relativa à taxa de docentes com nível superior no ensino fundamental. Em 2009, essa taxa estava em 73,1, muito abaixo da meta de 85,8 fixada para 2011.
A taxa de pessoas com qualificação profissional atendidas pelo sistema de ensino é mais uma exemplo de distanciamento entre os resultados dos programas e as metas fixadas no PPA até 2011. Em 2009, a taxa estava em 1,42%, enquanto a meta para 2011 é de 20%.
"Apesar de serem apresentados indicadores que podem ser monitorados, o governo não se compromete com metas quantificadas de efetividade da ação. (...) Por vezes, não fica clara a relação entre as metas e os indicadores dos programas. (...)", diz o estudo da Consultoria de Orçamento.
Um dos exemplos citados pelos consultores refere-se ao programa Brasil Sem Miséria, uma das prioridades do governo Dilma. A meta colocada no PPA 2012-2015 é "promover a inclusão social e produtiva da população extremamente pobre, tornando residual o percentual dos que vivem abaixo da linha de extrema pobreza". Ou seja, uma intenção genérica, sem indicadores específicos que permitam aferir se esse objetivo será ou não alcançado nos próximos quatro anos.
Os técnicos que analisaram o novo PPA concluíram que o modelo adotado reduz a transparência dos gastos públicos e dificulta o controle desses gastos. O estudo destaca, por exemplo, que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2012 recomenda que só as grandes obras devem ser fiscalizadas pelo Tribunal de Contas (TCU) e o novo PPA ampliou o valor de referência para obras de grande vulto, de R$ 20 milhões para R$ 100 milhões.
Além disso, os consultores destacam que a nova versão do PPA está completamente dissociada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que é o principal programa de investimentos do governo.
"Nota-se, portanto, o enfraquecimento do PPA como instrumento de planejamento tal como concebido pelo constituinte, em decorrência da multiplicidade de planos que são, na prática, utilizados pelo governo para comunicar suas ações à sociedade. A Constituição diz que o PPA deve servir de base para a elaboração e execução dos orçamentos anuais. Como as ações orçamentárias não constam mais do plano, não é possível distinguir, por meio do PPA, o que integra ou não o PAC, por exemplo", destaca o estudo.
No PPA 2012-2015, os dispositivos que tratam da gestão, do monitoramento e da avaliação do Plano foram reduzidos em comparação com o PPA 2008-2011, segundo essa análise.
- A questão da transparência é o grande problema. Até que ponto este PPA está servindo para melhorar o entendimento da sociedade organizada sobre as políticas públicas? - destaca Eliana Graça, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
A especialista concorda que o novo PPA está totalmente dissociado do Orçamento e observa que isso fere a Constituição, onde o plano é colocado como o início do ciclo orçamentário.
- Só posso saber se o planejamento está funcionando se compará-lo com ações efetivas que estão no Orçamento - pondera.
Graça vê alguns avanços no novo modelo em relação ao anterior, como a discussão prévia do plano com representantes da sociedade - organizações e conselhos de políticas públicas. E a preocupação do governo em reduzir as desigualdades sociais, mas destaca que a ausência de indicadores, a partir de 2012, provocará uma quebra na série histórica que é muito ruim para o controle social das políticas públicas.
— Posso achar muito legal as propostas para as mulheres, para os negros, mas quero saber o que vai ser feito concretamente no ano que vem para melhorar isso? - afirma.
Planejamento justifica mudanças
O Ministério do Planejamento defende o novo modelo do PPA, afirmando que o anterior "limitava o plano à estrutura orçamentária e era incapaz de revelar as escolhas e comunicar seus desafios e metas para a sociedade de forma transparente".
Na visão do Ministério, não houve perda de informações com a mudança no modelo. Por essa visão, o PPA tem a função "de apontar os principais compromissos e estratégias das políticas públicas, e o Orçamento o papel de revelar suas fontes de financiamento e detalhamento dos gastos, a partir de categorias distintas, mas aprofundando a complementaridade entre os instrumentos".
Em relação a indicadores que foram suprimidos, como o de adequação da escolaridade na faixa de 11 a 18 anos, o Planejamento responde que o novo plano traz outros indicadores que seriam mais adequados para aferir esse resultado, como "o percentual da população com 15 anos que concluiu o ensino fundamental; a taxa de escolarização líquida no ensino fundamental (de 6 a 14 anos); e a taxa de escolarização líquida no ensino médio (15 a 17 anos)". A nota do Planejamento continua: "As taxas líquidas de escolaridade apontam o percentual de alunos que estão matriculados em turmas adequadas à sua idade".
E cita como exemplo de "metas claras e objetivas que constam no programa de educação básica, as seguintes: elevar a taxa de escolarização líquida no ensino médio, de forma a alcançar a meta do PNE (Plano Nacional de Educação) 2011-2020; e elevar a taxa de escolarização no ensino fundamental para a população na faixa etária entre 6 e 14 anos, de forma a alcançar a meta do PNE".
A crítica dos especialistas, entretanto, é que os indicadores anuais foram substituídos por metas genéricas e bem mais amplas.
Exemplo semelhante é apresentado para justificar a subtração dos indicadores que apontavam a taxa de docentes com nível superior na educação fundamental. "O PPA 2012-2015 traz como meta a elevação do percentual de professores da educação básica que possuem formação específica de nível superior obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam, de forma a alcançar a meta do PNE 2011-2020. Esta meta revela uma preocupação mais ampla com a formação dos docentes", justifica o Planejamento.
O argumento de que não há aderência entre o PAC e o PPA não procede, na visão da pasta: "O fato de as ações não estarem no Plano não significa que o PPA e o PAC estão dissociados, pois no caso de iniciativas individualizadas de grande vulto todas estão no PAC e no PPA e, no caso de empreendimentos do PAC de menor porte, compõem o rol de ações orçamentárias vinculadas a uma iniciativa do PPA".
Outro exemplo de ação que não poderá mais ser avaliada é a relativa à taxa de docentes com nível superior no ensino fundamental. Em 2009, essa taxa estava em 73,1, muito abaixo da meta de 85,8 fixada para 2011.
A taxa de pessoas com qualificação profissional atendidas pelo sistema de ensino é mais uma exemplo de distanciamento entre os resultados dos programas e as metas fixadas no PPA até 2011. Em 2009, a taxa estava em 1,42%, enquanto a meta para 2011 é de 20%.
"Apesar de serem apresentados indicadores que podem ser monitorados, o governo não se compromete com metas quantificadas de efetividade da ação. (...) Por vezes, não fica clara a relação entre as metas e os indicadores dos programas. (...)", diz o estudo da Consultoria de Orçamento.
Um dos exemplos citados pelos consultores refere-se ao programa Brasil Sem Miséria, uma das prioridades do governo Dilma. A meta colocada no PPA 2012-2015 é "promover a inclusão social e produtiva da população extremamente pobre, tornando residual o percentual dos que vivem abaixo da linha de extrema pobreza". Ou seja, uma intenção genérica, sem indicadores específicos que permitam aferir se esse objetivo será ou não alcançado nos próximos quatro anos.
Os técnicos que analisaram o novo PPA concluíram que o modelo adotado reduz a transparência dos gastos públicos e dificulta o controle desses gastos. O estudo destaca, por exemplo, que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2012 recomenda que só as grandes obras devem ser fiscalizadas pelo Tribunal de Contas (TCU) e o novo PPA ampliou o valor de referência para obras de grande vulto, de R$ 20 milhões para R$ 100 milhões.
Além disso, os consultores destacam que a nova versão do PPA está completamente dissociada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que é o principal programa de investimentos do governo.
"Nota-se, portanto, o enfraquecimento do PPA como instrumento de planejamento tal como concebido pelo constituinte, em decorrência da multiplicidade de planos que são, na prática, utilizados pelo governo para comunicar suas ações à sociedade. A Constituição diz que o PPA deve servir de base para a elaboração e execução dos orçamentos anuais. Como as ações orçamentárias não constam mais do plano, não é possível distinguir, por meio do PPA, o que integra ou não o PAC, por exemplo", destaca o estudo.
No PPA 2012-2015, os dispositivos que tratam da gestão, do monitoramento e da avaliação do Plano foram reduzidos em comparação com o PPA 2008-2011, segundo essa análise.
- A questão da transparência é o grande problema. Até que ponto este PPA está servindo para melhorar o entendimento da sociedade organizada sobre as políticas públicas? - destaca Eliana Graça, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
A especialista concorda que o novo PPA está totalmente dissociado do Orçamento e observa que isso fere a Constituição, onde o plano é colocado como o início do ciclo orçamentário.
- Só posso saber se o planejamento está funcionando se compará-lo com ações efetivas que estão no Orçamento - pondera.
Graça vê alguns avanços no novo modelo em relação ao anterior, como a discussão prévia do plano com representantes da sociedade - organizações e conselhos de políticas públicas. E a preocupação do governo em reduzir as desigualdades sociais, mas destaca que a ausência de indicadores, a partir de 2012, provocará uma quebra na série histórica que é muito ruim para o controle social das políticas públicas.
— Posso achar muito legal as propostas para as mulheres, para os negros, mas quero saber o que vai ser feito concretamente no ano que vem para melhorar isso? - afirma.
Planejamento justifica mudanças
O Ministério do Planejamento defende o novo modelo do PPA, afirmando que o anterior "limitava o plano à estrutura orçamentária e era incapaz de revelar as escolhas e comunicar seus desafios e metas para a sociedade de forma transparente".
Na visão do Ministério, não houve perda de informações com a mudança no modelo. Por essa visão, o PPA tem a função "de apontar os principais compromissos e estratégias das políticas públicas, e o Orçamento o papel de revelar suas fontes de financiamento e detalhamento dos gastos, a partir de categorias distintas, mas aprofundando a complementaridade entre os instrumentos".
Em relação a indicadores que foram suprimidos, como o de adequação da escolaridade na faixa de 11 a 18 anos, o Planejamento responde que o novo plano traz outros indicadores que seriam mais adequados para aferir esse resultado, como "o percentual da população com 15 anos que concluiu o ensino fundamental; a taxa de escolarização líquida no ensino fundamental (de 6 a 14 anos); e a taxa de escolarização líquida no ensino médio (15 a 17 anos)". A nota do Planejamento continua: "As taxas líquidas de escolaridade apontam o percentual de alunos que estão matriculados em turmas adequadas à sua idade".
E cita como exemplo de "metas claras e objetivas que constam no programa de educação básica, as seguintes: elevar a taxa de escolarização líquida no ensino médio, de forma a alcançar a meta do PNE (Plano Nacional de Educação) 2011-2020; e elevar a taxa de escolarização no ensino fundamental para a população na faixa etária entre 6 e 14 anos, de forma a alcançar a meta do PNE".
A crítica dos especialistas, entretanto, é que os indicadores anuais foram substituídos por metas genéricas e bem mais amplas.
Exemplo semelhante é apresentado para justificar a subtração dos indicadores que apontavam a taxa de docentes com nível superior na educação fundamental. "O PPA 2012-2015 traz como meta a elevação do percentual de professores da educação básica que possuem formação específica de nível superior obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam, de forma a alcançar a meta do PNE 2011-2020. Esta meta revela uma preocupação mais ampla com a formação dos docentes", justifica o Planejamento.
O argumento de que não há aderência entre o PAC e o PPA não procede, na visão da pasta: "O fato de as ações não estarem no Plano não significa que o PPA e o PAC estão dissociados, pois no caso de iniciativas individualizadas de grande vulto todas estão no PAC e no PPA e, no caso de empreendimentos do PAC de menor porte, compõem o rol de ações orçamentárias vinculadas a uma iniciativa do PPA".
* Jornal O Globo
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